sábado, 5 de maio de 2012

O vidro de perfume – Mito




As pétalas agarravam compulsivamente seu ao redor. Seu corpo era frio e torneado. Belíssimo. Por gerações guardou odores intocáveis, sublimes. Recomposto, pertencera a mulheres comuns, mundanas, serenas. Fez-se vidro num fogo ardente, moldaram-no cheio de graça. Foi que assim que nasceu, recobriram seu corpo em choque, finíssimo, chiquérrimo, com pinceladas tocantes, emocionais. Reproduziram nele a arte de um homem que amava. E fora vermelho, até que perceberam que estava forte. E fora azul, até que perceberam que estava calmo. E fora branco, até que perceberam que estava nada. E fora de várias cores, e flores, e poesias. E não mais perceberam, seduziram-se. E assim ficou.

Morou naquele bordel encantado. Viu camas tremerem, mil homens passarem, mas era ele, somente ele que escutava pensamentos, que via olhos brilharem, escorrerem, que soprava felicidade ou conforto. Ficava enfeite, bibelô, contudo, era mais, bem mais. Era o orgulho lindeza de cada mão por que passou. Viu violências, amores, latência, viu trovões e chuviscar. Respeitou cada decote daquele, pela inteireza de caráter que viu no múltiplo querer /não querer estar ali. Respeitou cada choro depois das visitas. Respeitou toda luz que se apagou. Respeitou a verdade que só ele via e cresceu.

Se pudesse, imitaria a gente, derramando-se. Porém já suspirava  quando lhe borrifavam. E naquela hora, em que o tempo se fazia menino/momento, e dava tanta graça aos olhos fechados que recebiam o aroma, ele era felicidade. Vidro de perfume. Em meia idade, foi parar numa casa de família, sentia-se triste pela melancolia alheia, mais empertigada que a que vira por anos, sobre aquelas penteadeiras femininas. Quis quebrar-se naquela monotonia. Até que um gato, bem-vindo, peludo, fez sua vontade.

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