segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Capítulo 6 – Sem poder evitar


Nem sei. Essa preocupação com minha própria alma fica dedilhando na mesinha. Faz a madeira roncar sofrimento. Cabeça baixa, ao teclado, só enxergo ali a dor, por entre meus punk-cachos, revoltosos como eu. Minha boca não quer ser mais tão vermelha. Não quero te expulsar de mim com meus atos estrondos. Quero ser um eu que nunca fui. Um eu completo de ti. Por que hoje eu vi, no meu sofrer, uma falta da tua boca que pouco tive, da tua barba que não toquei tanto, da tua vida que não enlacei.

Só me falta. Coragens, morais, pontarias. E me menti pra explicar-me. Enganei-me num não-amor de esquecer. Rastreei belezas, injuriei certezas, enjoei venturas. E me faço protesto contra fingimentos alados. Quero provar do meu próprio milagre, quero mostrar que tens também veneno. E já direi que o pecado é posto, é fato, é inconsolável, é verdade, é sagrado. É humano. Visto que não és santo, te digo que errei, e que em ato, me reivindico transformação. Posso ser luz, fonte, dormência.


Não entendo daquilo que vagueia por tuas entranhas. Me pareceu energia-sentir quando tocou meus dedos. E os meus, ciumentos, desmancharam-se pela resistência dos teus cachos-atrito. Quero tua mão invadindo minha palma. Quero teu fiapo de barba. Fecha o olho e se lembra. Não se importe comigo, só desejo, pura e unicamente, tuas verdades mais nuas.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Capítulo 5 - End!


Desistir não lhe era fato comum. Podia ser desafio conquistado. Sim, podia. Todavia, mais do que isso, era concretização do abstrato dentro dela. A liga era forte e os nãos pareciam só entorná-la. A atração, energia que fosse, não era suficiente pra ele. A moça repensou-se no banheiro. Mesmo dotada de toda aquela insistência e persuasão, não mais minaria-se por batalhas forçadas, carinhos arrancados, embora também oferecidos. Não devia ser, já que vulgarizava o sublime, pra ele.

Guerra perdida. Não haveria mais oportunidades para ele acender-lhe luzes fosfatas, consciências. Não teria tanta paciência, não buscaria mais cabimentos, só choraria por seu escuro adorado, sacro. Não levantaria discursos narcísicos, de tudo que se perdera. Afinal os conceitos que interessavam já haviam sido construídos por impulsos. Inverdades. E ele era para ela diferente, poderia até mudar-se ou voltar a parte boa que um dia foi. Mastigou a certeza de reconfiguração. Iria sim, mas agora por outros motivos.Perdas elucidadas subiriam pros pares de olhos.

Mesmo ali, onde ele negava e fazia, contradições, preocupava-se com olhares e pressões alheias. Ela entendeu que o muito especial fora um momento. E que as continuações não eram religiosamente praticadas. Mas seu consolo foi cansado. Um novo amor é sempre uma angústia pruma vida já preocupada. A moça ficou cansada somente por previsões. Um bom princípio, amor, corrosão do tempo, sustentação por companheirismos bairristas, um novo fim. Poderia ser diferente. Mas como as canções, os romances sempre repetem enredos. Desistiu.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Capítulo 4 - Feito

Até porque tinha caprichos saciados, buscou efemeridades de esquecer. Esbarrou em concórdias decididas, caminhos partidos, medalhas afrouxadas. E a operadora que dizia na TV ligar emoções, só estava a criar-lhe aflições aturdidas, com chamadas caídas. E o bipe que ensurdecia pela não-comunicação, assustou-a. Releu textos e resolveu metafalar numa continuação do que acabou acontecendo. Era o previsto por um coração ansioso. Feito. Verdades escorregaram por rostos roçados. Estradas corriam pra ver carinhos através do embaço de um vidro. O mato aplaudia, piegas.

Pensava agora no sentir, nas diminuições, nas reaveriguações. Inocências trocadas em semi-beijos estanques. Poderia jurar-lhe em linhas febris tudo que sentiu por horas-segundos, mas foi ali naquele colo terno que encontrou o paraíso. E o sol, que brechou pela cortina, depois de sair de uma nuvem densa, subiu, e lá do alto a viu adormecer.

Aquela sensação clichê e sublime pesou em sono. Feito sonho, recortou aquela felicidade mascando um sorriso meia-lua, aspirante, energia. O braço dele pesava perfeito como a justiça divina. Cedeu ao convite de aquecer seu coração com o dele. Podia morrer ali de tanto conforto e por um amor que não sabia se tinha. Mas não imaginava o que vinha pela frente. Distâncias milimetradas pesariam nos dias seguintes. Tentou afastá-las, porém a operadora teimava em atrasar conversas, ferver sentimentos, gerir destinos. Ela se achava fatalista. Talvez fosse. Talvez não. Foi escrever.