terça-feira, 20 de julho de 2010

Sempre só. Flor, realmente...

É tudo vazio. Plena, repleta, vestido de tecido barato, estampado. Flor. Ela se enche. Gasturas de vida. Pedais que passeiam a procura de algo que nunca vai encontrar. Desejos, intensos, mórbidos, desbaratados. Queria sair. Matando, sem motivo. Por não ter. Isso tudo não é fútil. Quem quer contestar o vago, o inóspito, o inútil, a preguiça? É perfeito pra ela que quer usar, desmembrar, vaguear. Ingerir. Pelo menos não por essas bandas. O preto dos olhos, das unhas, da alma. É vermelha como a natureza do seu ego errante. E que vibra mais que o celular que suplica uma chamada de retorno. Tantos, não são outros. São quantidade, qualidade, transitórios. E passam. Cafuçus. Porenquantos ardentes são pílulas que a ajudam a ir levando. Até que se chegue o dia/hora/momento ideal pra mais um recomeço que depois vai acabar. Até ai tudo bem.

Flor é mulher_guerreira_vaidade. Não olha pros lados por medo de cair. Nas graças, ela se entende com os outros. Não nasceu mulher, se tornou uma. Flor. Pelo menos é o que escreveu a senhorita de Beauvoir. Já sabia. Ela não. Queria estar em todos os momentos por ali, por acolá. Era tensa. Unha crescente como a lua daquele dia. Não tinha dinhe
iro pra pagar a ioga. Não tinha paciência. Tinha que ter, foi aprendendo. Inutilidades passaram a atraí-la. Flor saiu da sua janela habitual de grades para compor cenários de paisagens mais trabalhadas. Aqueles excessos a corroíam. A burguesia ainda fedia embora com tantos perfumes. O exclusivo marasmo enjoativo_pernóstico a induziu a pensar em outras possibilidades. Esmaltes, sapatos, comida. Umas – leia-se muitas - esfihas podiam resolver. Pena! O Habbib’s não aceitava cartão de crédito. Fora traída por seus depósitos de confiança. No banco, na cadeira, no seu ex-gato. O que faria agora, Perguntou-se. Ah, pena não viver mais, como na infância, pelos ares dos seriados mexicanos, de cenário pobre e roteiro rico e engraçado. Ainda tinha aquela blusa tão clichê quanto tatuagem, na qual figurava o grande CH. E as frases_jargão do Chaves e do Chapolin. Isso, isso, isso ou sigam-me os bons. Pensou: como assim? Seguir por seguir, ainda restava o twitter. Gostava de mergulhar de vez em quando. No mar, nas nuvens, ou nos seus pensamentos. Lascara-se algumas vezes por essa mania. Já inundou um travesseiro poeirento com dores remelentas de (uns) sujos. Por que agredir seus olhos, já tão cansados? Pensava. E dormia. Flor estava para desabrochar. A dor costuma obrar milagres. Acreditem.

Munida de luzes de narcisismo, que sempre a permeou reconditamente, ela foi. E foi pra ir mesmo. Vejam só. Tão pouquinha aquela... Era feito a do asfalto de Drummond. Nauseada. Mas era realmente uma flor. Supinpa, como ouviu em alguma séria velha da TV aberta – lisa, sem dinheiro pra TV a cabo – Flor andou. Rua acima, rua abaixo. O salto incomodava. Voltemos ao comum, o blá blá blá de sofrer pela beleza e tal. Enfim, ali estava ela brilhosa. Nem parecia aquela menina sofrida, de poucas viagens. Tá, vamos deixar de gongá-la. Chegou na porta da festa. Lá, ele. Deitou sobre ela seus olhos alcoólicos e ficou. Teso, parado, sem medir. Ou medindo. Tantas coisas, lembranças, pesares. Largou e veio cambaleante rumando a ela. Flor foi. Passo a passo, modelo de elegância nordestina, com a bolsinha de crochê. Elementos repetidos, cores, formas, texturas. Um perfume arisco, marcante, seguiu. Parecia até câmera lenta, mas não era. Puro nervosismo. De perto, o astigmatismo de Flor o deixou mais belo do que se lembrava. Camisa branca. Passou. Ave! Pensou, porque logo essa. Essa do aniversário. Meses atrás. Deixou pra lá. “O samba me persegue...”E ela começou. Pasmo, como uma Barbie dentro da caixa, ele a viu dançar como nunca fizera. Arreégua. Mudou mesmo.Lastimou-se o infeliz. É assim. Resolveu daquele momento em diante que a colheria pra si. Foi lá. Já era tarde. Flor estava em profundos beijos com o pseudo-intelecual de barbicha, olhos claros, pedantismo e cabelo estilo Fiuk_Che Guevara_vocalista da Calcinha Preta. Ha há há. Não podia se dar ao trabalho de ficar atrás. Era o rei da merda. Como assim? Pensou. A Flor aprenderia. Ela não poderia pintar as unhas de verde e sair beijando qualquer um que fizesse uma universidade pública para a qual ele não conseguira passar. Há há há! Queimava-se. Queixou a primeira loira que lhe desposou um olhar pedinte. Linda, musa, forte. Até demais! Retrucou pra si próprio. Algo lhe incomodava. Além dos apertos sólidos além da conta da loira e do fato de Flor o ignorar. Algo mais lhe incomodava. Além do volume que se contraia contra ele. Não era o seu. Não era a bolsa dela. Estava bêbado demais para averiguar. Esqueceu. Jogava pequenas rabissacas para Flor. Ela, esplêndida, continuava ali, com uma gelada Stella Artois na mão de unhas minúsculas e verdes. Foi retocar o batom que agora descia garganta abaixo do garoto de blusa_souvenir de Pernambuco. Ai meu Deus! Questionou-se. Como fiz aquilo. Bem doida. Era outra, era diva. E diva não tem arrependimentos. Diva é sempre diva. Segundo o comercial do sabonete Lux. Pensou. Fustigou a situação, provocou por que quis. Bem feito. Tudo de novo. Repetiu-se a cena ao som da banda bate-lenta, e das luzes piscantes das TVs espalhadas, com cenas que destoavam do ritmo reinante. Buarquices. Embalos de sábado a noite a movimentar gringos, marias, joãos, patrícias e maurícios. Fato. Ela cansou daquilo. Saiu dali, exausta. Não sabia o que estava doendo mais, se era seu orgulho, seu coração ou o solado de seus pés. É, essa bandinha é boa! Avaliou. Sentou no paralelepípedo rente a calçada. Chorou. A rua lhe chamava. Atendeu. Descalça, como toda boa bêbada em fim de festa, pelo asfalto. Voltemos a Drummond. “Uma flor nasceu na rua!Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto.Façam completo silêncio, paralisem os negócios,garanto que uma flor nasceu.Sua cor não se percebe.Suas pétalas não se abrem. Seu nome não está nos livros.É feia. Mas é realmente uma flor”.Até parece. Flor embarcou pela rua, em busca de novos vasos, onde pudesse ser plantada. Até ser colhida novamente. Entrou na boate seguinte.

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